sexta-feira, abril 10, 2009

Uma boa dica de cinema

Entre os Muros da Escola (Entre les Murs), de Laurent Cantet, 2008

Este filme, baseado no romance escrito por um professor de literatura francês sobre suas experiências lecionando numa escola no suburbio de Paris, é uma reflexão sobre a educação e, de tão bem feito, parece que se assiste a um documentário. A naturalidade da interpretação dos atores, a câmera na mão, com movimentos precisos e hipnóticos, bem como a simplicidade do cenário (a sala de aula e os ambientes escolares), faz com que o espectador se situe numa zona entre a ficção e o real, o que permite ao filme alcançar um nível de sensibilidade único. Para se ter uma idéia dessa aproximação com o documental, o protagonista-professor é interpretado pelo próprio autor do romance e co-roteirista do filme, os alunos possuem o mesmo nome dos próprios atores e o filme não tem nenhuma música, se baseando apenas nos diálogos.

Mas não se trata de uma escola comum, e aí a questão se torna ainda mais interessante: É uma escola pública, onde os alunos da sétima série são, na maioria, imigrantes. As primeiras impressões são de que o filme retrata o multiculturalismo e os problemas da relação entre imigrantes e a cultura francesa, retrata os problemas entre alunos e professores, ou o embate entre uma cultura jovem, de gírias e modismos, com a cultura acadêmica, a lingua formal ensinada na escola. É muito mais que isso; centrado nas relações entre as pessoas, o filme transforma o olhar sobre a escola, pois é lá onde, olho no olho, as relações humanas acontecem cotidianamente.

A dificuldade do professor em domar uma turma de adolescentes, sua intenção expressa em educar os alunos, enfrentando todo tipo de ameaças, desde desatenção até o desrespeito e a agressão, dignifica o papel do professor. As relações na escola são espelho das relações no mundo: a economia, a cultura de massas, os códigos de etiqueta, bem como as leis e regras sociais são intermediários na relação entre os homens. Se buscarmos o cerne da questão, podemos encontrar algo primitivo, uma política no sentido essencial do termo, das relações de poder, de amizade e inimizade, que existem mesmo entre duas ou mais pessoas. O filme, vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes 2008, trabalha no sentido de desvendar isso.

Após uma primeira impressão de um filme-tese, onde simplesmente os conflitos aparecem de forma documental, a história descamba para uma trama muito sofisticada, onde aparece um dilema moral. Numa confusão em sala, onde o professor teve sua parcela de culpa, um aluno se descontrolou: ele deve ou não ser expulso da escola? Os problemas da rígida educação francesa são discutidos nesse filme diferente e impressionante. Eles são colocados de forma tão elaborada, que ultrapassam fronteiras, servindo para pensar a escola no mundo. Mais do que isso, o filme discute algo absolutamente humano e acerta no alvo, desvenda um pouco da própria humanidade, o que é essencial num filme ou em qualquer obra de arte.

Fonte: opiniaoenoticia.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário