terça-feira, janeiro 26, 2010

Apontamentos levianos para um ensaio gravíssimo: a TDN

A chamada Técnica do Deputado Nordestino (denominação em que há inegavelmente uma dose de preconceito, visto que políticos de qualquer latitude dela lançam mão), ou apenas TDN, é a maior aliada do escritor que precisa preencher determinado espaço com suas letrinhas em prazo curto – o que a torna especialmente valiosa para cronistas.

Trata-se, em resumo, de uma longa reiteração, de um incansável repisar da mesma idéia, com variações vocabulares, sintáticas e imagísticas engenhosamente dispostas de modo a disfarçar o fato desolador de que o texto não vai a lugar nenhum, limitando-se a bater na mesma tecla e sovar uma única proposição até que ela amoleça, se liqüefaça, desmanche diante do leitor e possa ser sorvida com canudinho – mais ou menos, repare, como se faz aqui, agora.

Sabe-se que o movimento é importante para o sucesso de um texto, que deve sair de um ponto A e chegar a um ponto B – ou G, ou X, conforme a capacidade do autor – por meio de um desdobramento dialético em que, não raro, cada passo corresponde a um parágrafo. Infelizmente, sabe-se também que isso dá um trabalho danado. O número de sinapses necessário para ligar esses pontos pode ser de fato desanimador, dependendo do prazo e da remuneração. É aí que entra a TDN, que substitui o movimento por um rodopio neurótico no mesmo lugar. Por que dizer apenas “minha administração será marcada pela honestidade” quando o comício é longo e pode ser preenchido por algo como “minha administração, minha gestão, minha atuação à frente da coisa pública será pautada, será marcada, será fundada e balizada pela honestidade, pela retidão, pela transparência e, por que não dizer, pela absoluta priorização do bem geral da população contra qualquer interesse espúrio, qualquer negociata, qualquer dessas pragas que…” – e por aí vai, indefinidamente.

A TDN é um truque antigo, mas sempre eficaz. Vítor Martins, letrista de Ivan Lins, construiu toda uma carreira com ela (analise “Começar de novo”, por exemplo), e muitos cronistas de renome veriam sua vasta obra minguar a três ou quatro páginas sem o auxílio desse inestimável expediente. Que, para completar, ainda costuma valer ao autor comentários boquiabertos como este:

“Puxa, como ele sabe trabalhar a linguagem!”

(Sérgio Rodrigues)

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