Pesquisadora fala sobre a dependência de crack
Professora da Unifesp, doutora Solange Nappo, pesquisadora e professora de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo, fala sobre a dependência de crack.
Efeitos causados
O usuário de crack não tem efeitos desde o início. Começa tendo mais efeitos positivos, e, por isso, repete o uso da droga. Começa a utilizar o crack. O efeito do crack dura apenas cerca de cinco minutos, em muitos casos. Então, como dá prazer, o usuário passa a usar outras vezes, e começa a desenvolver outros efeitos, como a psicose, a paranóia. Ele começa a desconfiar de todo mundo, escuta vozes.
Depois da psicose, ele tem a fissura,que ocorre o tempo todo do uso. Ele está usando a droga e já está em fissura, tanto que não para de usar. Ele fuma de forma ansiosa, já visando usar mais.
Depois, ele tem uma depressão, em função da droga, e não do arrependimento. A droga acaba com os neurotransmissores. Depois, com a recomposição do organismo, ele volta da depressão.
Como reduzir a fissura do usuário
Tem várias possibilidades de se ajudar nessa fissura. Os próprios usuários inventam medidas para isso, que não são as mais corretas. É muito comum o usuário de crack utilizar álcool, na expectativa de que essa fissura passe. Os efeitos até diminuem, mas a médio prazo ele assume outra dependência. Aí, quando usa crack, fica com vontade de tomar álcool e vice-versa. Também há usuários que fumam maconha, inclusive misturando os dois. Em relação a medicamentos, quando alguém está em fissura tem que tomar calmantes para ajudar a relaxar o sistema nervoso.
Como a maconha abre portas para outras drogas
Quando a pessoa fuma maconha, naquele momento você está relaxado e não tem nenhuma outra atividade. Se tivesse que ter outra atividade no mesmo momento, com certeza teria uma diminuição do rendimento.
A maconha abre porta para outras drogas porque ela é ilegal. Uma vez que já transgrediu as regras, a chance de usar outras drogas ilegais fica mais fácil. Álcool também é uma droga devastadora quando a pessoa vira dependente, mas grande parte dos alcóolatras não usa outras drogas. A maconha abre portas nesse sentido, porque ela é do tráfico e do mercado ilegal.
Ex-viciados têm dificuldade em relacionamentos interpessoais
Isso é passageiro. É preciso não desistir. Essa dificuldade existe porque a pessoa ficou muito tempo afastada do “mundo dos caretas”. Você tem que se moldar a esse novo mundo. Vai fazer coisas que deixou de fazer. É preciso lutar com isso, não ficar o tempo todo crítica a ponto de dizer que não dá certo. Não desista que é passageiro.
Tempo de permanência da cocaína no sangue
Quando as pessoas utilizam cocaína, fica na concentração sanguínea por volta de 100 minutos, 150 minutos. Depois disso, não tem mais os efeitos e é por isso que as pessoas voltam a usar. Isso também não quer dizer que nesses 100 minutos ela estará o tempo todo fazendo efeito.
Como agir com pessoas que tiveram recaídas
Quando uma pessoa vai para o tratamento, imagino que ela quis fazer e, por isso, ficou um tempo sem usar a droga. Além de ter a vigilância dela e de um psicólogo, sempre recomendamos que tente evitar o mundo em que vivia anteriormente.
Quando o usuário passa perto desses locais, ele entra novamente em fissura. Se ele voltar com os mesmos amigos, morar no mesmo local, ele não vai conseguir se controlar. É preciso estar com ele, ajudar, e ser vigilante o tempo todo. Se está no começo, que ele substitua essa droga por alguma situação de lazer, de prazer, de amor.
Se não tiver jeito, é preciso ajudar a controlar esse uso e que esse uso não pertube a vida do casal, por exemplo. Se ele voltar a ser compulsivo, terá que interná-lo. Se ele ainda não está compulsivo, converse com ele para ver se ele consegue ter um controle disso. Ajude nisso e faça com que ele seja um controlado.
O tempo de permanência em fissura
Não tem tempo real. A fissura está muito ligada ao que ele vai conseguir depois. É 5 minutos se depois de 5 minutos ele consegue uma droga. Pode ser 40 minutos ou uma hora, se ele não conseguir a droga. Não é simples.
As sequelas do crack
Não existem sequelas orgânicas. A destruição de neurônios não é do crack. O crack acaba destruindo alguns vasos sanguíneos e pode perder algumas funções da fala, que recupera depois. Pode ter diversos problemas cardíacos, pois estará sempre em hipertensão.
O usuário do crack é o que tem mais dificuldade em ser reinserido na sociedade. Esse talvez seja o maior problema do uso do crack. Uma sequela muito complicadora é a gestante que usa crack, o filho nasce com dificuldade de raciocínio.
Como tratar um dependente após uma recaída
A recaída é muito comum nos usuários de droga em geral, mas no crack é mais pela fissura, pela compulsão que ele desenvolveu ao usar a droga. Ele é um paciente difícil. Se ele não virou um compulsivo outra vez, ainda terá chance.
Hoje em dia, trata-se o usuário de drogas não pensando na abstinência total. Ele é tratado em se pensando na qualidade de vida, e que ele não rompa com seus tripés da sociedade, com a família. Que continue trabalhando.
O tratamento sempre visa a abstinência, mas nem sempre isso é possível. Às vezes temos que conviver com uma pessoa que use drogas de uma maneira controlada e que não cause problemas para as pessoas a sua volta.
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