terça-feira, abril 17, 2012

Escrever antes ajuda a acalmar e melhora o desempenho

Você fica ansioso quando vai fazer uma prova? E isso atrapalha seu desempenho? Infelizmente, nas situações mais importantes, a performance das pessoas acaba sendo mais baixa do que suas capacidades; é como se elas sofressem um bloqueio. Mas um estudo da Universidade de Chicago, publicado na Science do dia 14 de janeiro, deve ajudar a diminuir o nervoso na hora da prova. Os pesquisadores Ramirez e Sian Beilock mostraram que escrever um pouquinho sobre essa ansiedade minutos antes da prova contribui para diminuir a agonia dos alunos. Um breve texto feito 10 minutos antes do teste pode evitar bloqueios e melhorar a nota em até um ponto.

No exercício da escrita, os alunos descarregam suas ansiedades antes de fazer a prova e, portanto, liberam recursos intelectuais necessários para completá-la com sucesso – recursos normalmente tomados por preocupações em relação à própria prova.


Em uma pesquisa anterior, Beilock demonstrou que situações de pressão podem esgotar uma parte do cérebro conhecida como memória de trabalho. Essa memória é uma espécie de bloco de rascunho mental que permite que as pessoas "organizem" informações relevantes para a tarefa. Quando as preocupações são muitas, as pessoas normalmente usam a memória de trabalho para resolver os problemas e acabam por sobrecarregá-la. Assim, perdem parte da capacidade do cérebro para completar a tarefa – nesse caso, a prova.

Experimentos

Para provar essas idéias, Ramirez e Beilock recrutaram 20 estudantes universitários e deram a eles dois testes de matemática curtos. No primeiro, os estudantes só precisavam dar o melhor de si. Antes do segundo, os cientistas criaram uma situação de estresse: disseram que os estudantes que tivessem um bom desempenho receberiam dinheiro e que todos dependiam da melhora do desempenho do grupo – como forma de criar pressão entre os colegas. Eles também foram informados de que seu trabalho seria filmado, e que os professores de matemática assistiriam depois. Metade dos alunos receberam 10 minutos para escrever sobre seus medos e angústias sobre a prova (grupo da escrita), e a outra metade deveria permanecer sentada e quieta (grupo controle).
Jason Smith
Sian Beilock em seu labortório na Universidade de Chicago
O grupo da escrita teve um desempenho significativamente melhor do que o grupo controle. "Os participantes que não escreveram tiveram uma queda de 12% do primeiro para o segundo teste, enquanto os alunos que expressaram seus pensamentos antes do teste de alta pressão tiveram uma melhora de 5%", escreveram os pesquisadores.

Em outro experimento, os pesquisadores mostraram que não era apenas o ato de escrever que ajudava os alunos. Na verdade, escrever sobre seus sentimentos em relação ao teste é que evitou que eles "travassem" na hora da prova.

Os pesquisadores também realizaram dois experimentos envolvendo estudantes de biologia no primeiro exame final de suas vidas no ensino médio. Pediram que eles escrevessem o texto seis semanas antes do exame final com o seguinte tema "Durante os testes, eu me pego pensando sobre as conseqüências do meu fracasso".

No outro experimento, minutos antes do exame final da biologia, alguns alunos deveriam escrever sobre seus sentimentos em relação à prova, e, outros, pensar sobre temas que não tinham a ver com ela. Quando os pesquisadores examinaram as notas dos alunos, descobriram que estudantes que não haviam escrito ficaram mais ansiosos e com nota menor, B-. Por outro lado, quem teve a oportunidade de escrever antes do exame teve uma performance tão boa quanto os colegas que normalmente não ficam ansiosos em testes – tiraram B+.

Mesmo que o professor não dê a chance aos alunos de escrever antes da prova, eles devem fazer isso de forma independente para melhorar seu desempenho. "Na verdade, achamos que esse tipo de escrita ajuda as pessoas a atingirem sua melhor performance em várias situações em que estão sob pressão: uma apresentação a um cliente, um discurso para uma platéia ou até mesmo uma entrevista de emprego", disse Beilock. "O bloqueio nos exames é um problema grave, uma vez que esse desempenho afeta futuras oportunidades acadêmicas", afirmou.

Filosofia pop

Ensinamentos de pensadores clássicos estão sendo usados como um guia para viver melhor — e prometem revolucionar até mesmo a terapia. Entenda como esses sábios do passado podem nos ajudar com os problemas de hoje



Editora Globo
Não faz muito tempo que ler sobre filosofia era visto como coisa de gente que pensa demais, que vive em um mundo paralelo. Mas, desde o começo da última década, uma nova geração de pensadores vem se dedicando a popularizar a disciplina. Nomes como o suíço radicado em Londres Alain de Botton, o britânico Trevon Curnow e o americano William Irvine têm mostrado que pensadores das antigas podem ajudar você com eternas questões da humanidade, claro, mas também com problemas contemporâneos, como a ditadura da magreza ou o excesso de estímulos provocado pela internet.

A proposta tem feito sucesso. Basta um passeio por livrarias para constatar que a filosofia está na moda. Nas listas de mais vendidos há volumes como Aprender a Viver: Filosofia para os Novos Tempos, de Luc Ferry, e The Guide to Good Life (O Guia para a Boa Vida, sem edição brasileira), de Trevon Curnow. No Brasil, O Livro da Filosofia, de Will Buckingham, e Nietzsche para Estressados, de Allan Percy, estão no top 10 de não ficção. “O momento é propício. Vivemos em um mundo de acúmulo de informações e falta de significados. As pessoas estão se vendo forçadas a pensar filosoficamente para encontrar um sentido na vida”, afirma o australiano Peter Singer, professor de filosofia da Universidade de Princeton, nos EUA, e autor de Ética Prática.

Essa nova onda se baseia em uma antiga tradição da filosofia que reflete sobre a vida e serve de guia para a nossa existência — em vez de se preocupar com a definição de conceitos, como justiça, ética e verdade. Sábios da Antiguidade, como Sócrates, Sêneca e Epicuro, e alguns mais próximos na história, como Schopenhauer (1788- 1860) e Nietzsche (1844-1900), trabalhavam nessa linha de filosofia para o dia a dia, que renasce também em palestras, cursos e até em uma nova forma de terapia.

Nos EUA e na Europa, já existe a chamada terapia filosófica. Em consultas, o paciente fala livremente sobre sua vida, dificuldades e interesses, e o filósofo analisa o discurso e tenta mostrar as lições que pensadores como Platão e Aristóteles têm a apresentar no caso. Os profissionais são credenciados por associações como a Sociedade Americana para Filosofia, Aconselhamento e Psicoterapia, que tem 300 terapeutas licenciados — há 10 anos, eram 90. “As sessões ajudam com um problema que está na raiz de muitas crises de depressão e ansiedade hoje: o excesso de expectativas em relação à felicidade e ao amor”, diz Lou Marinoff, analista filosófico e autor de Mais Platão, Menos Prozac!.

Mesmo quem não pretende trocar Freud e Lacan por Sócrates ou Nietzsche tem encontrado espaço para filosofar. As instituições que oferecem cursos livres na área só se multiplicam. Com promessa de chegar ao Brasil neste ano, desde 2008 funciona em Londres a Escola da Vida, fundada por Alain de Botton, um dos expoentes da popularização da filosofia. Autor do novo livro Religião para Ateus e famoso por seu Consolações da Filosofia, de Botton mostra como as ideias de pensadores de outros tempos podem ajudar em questões atuais. Sua escola segue a proposta, com palestras e cursos sobre dieta vegetariana, equilíbrio entre trabalho e vida, como ser cool e as diferenças entre amizade real e virtual. “A filosofia é um modo de pensar. Pode descrever qualquer assunto — sexo, bebês, dinheiro, esquis.”

Músculos são cultivados em laboratório

Cientistas estão construindo músculos com ajuda de células-tronco


Editora Globo
Horas de academia? Anabolizantes? Que nada - implante de células tronco modificadas! // Crédito: Shutterstock

Como você sabe, nossos músculos (e os de qualquer animal) ficam maiores a partir de exercícios repetitivos que os estimulem. A novidade é que, com essa técnica, cientistas estão criando – e aumentando – músculos em laboratório por motivos médicos e culinários.
Em teoria, músculos mais fortes poderiam ajudar pacientes com incontinência urinária a controlar melhor suas bexigas, como foi verificado por pesquisas na Universidade de Pittsburgh.
Transformando células-tronco em fibras musculares, depois injetando-as nos pacientes, eles fizeram com que os seus músculos abdominais ficassem mais fortes e fosse mais fácil controlar a urina.
Além disso, a técnica poderia trazer carne mais barata para nossas mesas. A Universidade de Maastricht está produzindo tecido muscular bovino para criar hambúrgueres de laboratório – tudo a partir de células tronco. A técnica não só diminuiria a crueldade com animais, como também é mais barata que criar um boi.
Além disso, uma espécie de carne feita de vegetais, é desenvolvida no Instituto. Ela tem  propriedades mais parecidas com as da carne de animal, tem mais gosto e fibras, ao contrário da proteína de soja comercializada atualmente.

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Um suculento bife de carne falsa, fabricado no Instituto Fraunhofer // Crédito: Divulgação Instituto Fraunhofer

Implante emite alerta de ataque do coração

O método acaba de chegar ao Brasil e poderá salvar milhares de vidas

Editora Globo
O aparelho emite alertas sonoros, vibratórios e de luzes para alertar sobre ataque cardíaco // Crédito: Divulgação
Um dos principais motivos de preocupação dos médicos, a morte por ataque cardíaco, poderá ser resolvido em breve com a ajuda da ciência. Uma empresa britânica desenvolveu o dispositivo AngelMed Guardian, que, quando implantado no coração, avisa com antecedência a chegada de um ataque cardíaco. Agora, essa mecanismo acaba de chegar ao Brasil, disponível no site oficial da empresa.

Para mandar o alerta ao paciente, o sistema vale-se de uma combinação de vibrações, tons sonoros e avisos visuais, garantindo uma eficiente e quase infalível forma de automonitoração do problema.

O dispositivo oferece dois níveis de urgência de alarme: um de alta prioridade, que indica que o paciente está começando a ter o ataque e deve correr para o hospital, e um de prioridade moderada que indica que algum problema foi detectado e que paciente precisa de consulta médica no prazo de até 48 horas.

Atualmente o sistema encontra-se nas últimas fases dos testes clínicos e, assim que lançado, não sairá por menos de 12 mil dólares. Apesar do alto custo, a tecnologia tem potencial de salvar milhões de vidas em todo o mundo.

As doenças do coração estão entre a principal causa de morte nos Estados Unidos. De acordo com o Centro Americano de Controle de Doenças, são 800 mil óbitos todos os anos no país, e, no Brasil, esse índice também é alto, são mais de 300 mil óbitos anualmente.

Apesar de campanhas generalizadas para ajudar os pacientes a reconhecerem os sintomas da doenças a tempo, mais de 30% das pessoas que sofrem ataque cardíaco morrem antes de encontrarem atendimento médico.

Cobertura de tornado e foto chocante em Cabul levam prêmios Pulitzer

Lista de vencedores da renomada premiação foi anunciada em Nova York.
Jornal ajudou a localizar vítimas e enfrentou problemas devido a tornado.


A lista de vencedores do Prêmio Pulitzer foi anunciada neste segunda-feira (16) em Nova York.
Entre os vencedores, a categoria de notícia urgente ("breaking news") foi levada pelo jornal "The Tuscaloosa News", do Alabama, com a cobertura do tornado de 27 de abril de 2011 que destruiu grande parte da cidade. Em 2011, a comissão não entregou nenhum prêmio nessa categoria.
Em seu anúncio do prêmio, a diretoria do Pulitzer citou o Tuscaloosa News pelo "uso das mídias sociais além da reportagem tradicional para fornecer atualizações em tempo real, ajudar a localizar pessoas desaparecidas e produzir reportagens aprofundadas mesmo após uma queda de energia que levou o jornal a ser impresso numa outra gráfica a 50 milhas de distâncias".
Cobertura sobre tornado no final de abril do ano passado garantiu prêmio a jornal do Alabama (Foto: AP/Dusty Compton/The Tuscaloosa News)Cobertura sobre tornado no final de abril do ano passado garantiu prêmio a jornal do Alabama (Foto: AP/Dusty Compton/The Tuscaloosa News)
O "Philadelphia Inquirer" venceu na cobiçada categoria de serviço público, e um jornal da Pensilvânia, o "Patriot-News", ficou com o prêmio de reportagem local por sua cobertura do escândalo de abuso sexual na Universidade Penn State.
O prêmio ao "Philadelphia Inquirer" foi descrito pela direção do Pulitzer como "a exploração da violência difundida pelas escolas da cidade", superando os concorrentes "The New York Times e Miami Herald".
Não houve entrega de prêmio na categoria ficção. Essa foi a primeira vez desde 1977 que a diretoria do Pulizter decidiu não entregar um prêmio para a categoria.
Já o prêmio de melhor fotografia de notícia urgente foi para Massoud Hossaini, da agência France Presse, com uma imagem chocante de uma menina gritando em desespero após um atentado que tirou a vidade de familiares dela em Cabul, no Afeganistão.
Massoud Hossaini (dir.), da France Presse, e parte da sua foto, que venceu o prêmio. Clique para ver a imagem por inteiro ( o conteúdo é forte) (Foto: AFP e AP/Pulitzer via AFP)Massoud Hossaini (dir.), da France Presse, e parte da sua foto, que venceu o prêmio. Clique para ver a imagem por inteiro ( o conteúdo é forte) (Foto: AFP e AP/Pulitzer via AFP)
O jornal "The New York Times" ficou com duas premiações, uma por texto explanatório escrito por David Kocieniewski sobre impostos para a saúde e outra por reportagem internacional, com Jeffrey Gettleman e seus "vívidos relatos, geralmente envolvendo perigo pessoal, de fome e conflito no leste da África".
A Associated Press foi reconhecida por uma série investigativa detalhando o acompanhamento de minorias e muçulmanos suspeitos após os atentados do 11 de Setembro pela polícia de Nova York.
Administrado pela Universidade de Columbia, o Pulitzer é entregue em uma série de categorias do jornalismo, literatura, drama e poesia. Cada vencedor recebe US$ 10 mil de prêmio. A lista completa com os vencedores está disponível na página do prêmio.

Reino Unido deve superar Brasil em 2012 e registrar 6º maior PIB, diz FMI

Em 2011, Brasil passou o Reino Unido e se tornou a 6ª economia global.
FMI prevê que PIB brasileiro irá crescer 3% em 2012 e britânico, 0,8%.


O relatório “World Economic Outlook”, com perspectivas para a economia global, divulgado nesta terça-feira (17) pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), projeta que a economia brasileira voltará a ser superada pelo Reino Unido em 2012 e que o país cairá para a posição de 7ª maior economia global.
O FMI projeta que a economia brasileira voltará a crescer mais que a britânica em 2012, mas prevê, entretanto, que o PIB nominal brasileiro em dólares ficará abaixo do PIB do Reino Unido. Ou seja, o FMI indiretamente prevê uma alta do dólar em relação ao real.
O fundo prevê um crescimento de 3% para o PIB brasileiro e de 0,8% para o PIB britânico em 2012. Já o PIB brasileiro em dólar deverá somar US$ 2,449 trilhões, abaixo dos US$ 2,452 trilhões do Reino Unido, segundo o relatório.
Em 2011, segundo os dados consolidados do FMI, o Brasil registrou o 6º maior Produto Interno Bruto (PIB) nominal. A economia brasileira alcançou em dólares US$ 2,492 trilhões em 2011, ante US$ 2,4217 trilhões da britânica. Foi a primeira vez que o PIB brasileiro apareceu à frente do britânico.
A ultrapassagem em 2011 se explica em grande parte pelos desempenhos das duas economias no ano passado: enquanto o Brasil cresceu 2,7%, a Grã-Bretanha teve expansão de 0,7%. Outro fator que teve peso no resultado foi a acentuada apreciação do real no período, superior à valorização da libra.
Ranking de países por PIB nominal (em US$ trilhões)
Posição 2011 2012 (Projeção)
EUA (15,094) EUA (15,609)
China (9,729) China (7,991)
Japão (5,869) Japão (5,980)
Alemanha (3,577) Alemanha (3,478)
França (2,776) França (2,712)
Brasil (2,492) Reino Unido (2,452)
Reino Unido (2,417) Brasil (2,449)
Itália (2,198) Itália (2,066)
Rússia (1,850) Rússia (2,021)
10º Canadá (1,736) Canadá (1,804)
Fonte: Fundo Monetário internacional
Câmbio
Uma das explicações para a Grã-Bretanha voltar a superar o Brasil em 2012, mesmo a economia brasileira tendo uma previsão de crescimento maior, seria uma maior depreciação do real frente ao dólar em 2012 na comparação com a média do ano passado, ao passo em que o FMI projeta uma valorização da libra frente ao dólar.

"Pelo que vimos nos últimos dois, três meses, está claro que há uma política nesse sentido no Brasil, e o FMI deve estar levando isso em conta. O câmbio que tem rodado por volta de R$ 1,85, puxado por intervenções da Fazenda e por ações contundentes do do Banco Central no mercado comprador", afirma Silvio Campos, da consultoria Tendências.
O FMI projeta uma apreciação de 1,75% da libra frente ao dólar em 2012. Pelos cálculos da Rosenberg & Associado, o real deve ter uma desvalorização de 8,9% frente ao dólar neste ano.
"Em 2011, a cotação do dólar teve a média de R$ 1,67. Para 2012, estamos projetando uma média de R$ 1,82 no ano", afirma o analista Daniel Lima. "Quando se compara PIBs em dólares sempre há esse efeito do câmbio, por isso o melhor é sempre comprar o PIB per capita, e neste critério o Brasil continua bem atrás", acrescenta.
No relatório divulgado nesta terça-feira , o FMI elevou a previsão de crescimento mundial deste ano em 0,2 pontos percentuais, em relação às projeções de janeiro, para 3,5%. O PIB dos Estados Unidos teve a previsão aumentada em 0,3 p.p, para 2,1%, e o Brasil, em 0,1 p.p, para 3%. Para a América Latina, Fundo aumentou estimativa de crescimento para 3,7% em 2012.
O fundo apontou que o desempenho no terceiro trimestre foi em linha com as previsões do relatório de setembro de 2011. “O PIB de muitas economias emergentes foi de certa forma mais fraco que o esperado, mas o crescimento surpreendeu para o positivo nas economias avançadas”, disse o relatório. Uma virada negativa no quarto trimestre é atribuída principalmente à zona do euro.

A internet se transformou numa grande 'A Praça É Nossa'

A internet se transformou numa grande "A Praça É Nossa". A gente senta no banquinho para acompanhar a vida dos outros e ri o tempo todo de piadas que nem sempre têm tanta graça.

Quando foi que a rede mundial de computadores, aquela que faria a gente visitar os grandes museus do mundo a partir de nossas confortáveis cadeiras, virou o reino da piada, do "meme", do vídeo fofo e engraçadinho?
NINGUÉM TASCA
Não que eu seja mal-humorada. Faz três dias que acompanho ansiosamente cada post do Como Eu Me Sinto Quando. Nem que eu seja uma "culturete" que quer passar todo o tempo na internet aprendendo alguma coisa.

Mas não gosto mais de abrir o Facebook e perceber que todo o mundo vê as mesmas coisas, lê as mesmas notícias (entre clicar e ler, quanta diferença!) e fala dos mesmos assuntos.

Viramos uma manada que se alimenta de virais engraçadíssimos, fofocas e notícias sensacionalistas. E que tem opiniões sobre absolutamente tudo --muitas vezes sem pensar realmente no que achamos, mas repetindo o discurso da vez.

O Instagram ficou disponível para Android? "É um absurdo", bradam indignados os que não querem "foto na laje" em sua "timeline".

O termo "orkutização" se espalha como um grande xingamento. "Orkutizar" nada mais é do que popularizar, o que é excelente. Afinal, quanto mais gente na brincadeira, mais chances de ela ser mais legal. "Orkutizar" devia, ainda, nos lembrar que foi por causa da rede social do Google que descobrimos o prazer de ficar em contato constante com amigos e conhecidos, contando das nossas vidas e acompanhando as deles.

Estamos em 2012, inclusão digital é uma realidade, mas ainda tem gente que acha que faz parte de um clubinho. A internet é mesmo capaz de contradições: é agregadora, mas também é exclusivista e excludente. Oferece todas as possibilidades, mas faz a gente consumir mais do mesmo.

Adoro um pôster que diz assim: "Você não é profundo. Você não é um intelectual. Você não é um artista. Você não é um poeta. Você tem, apenas, acesso à internet".

Como é tudo uma questão de acesso, tomara, então, que cada vez mais gente faça parte do "clube". Porque daí vai dar para dividir melhor o espaço entre o engraçado, o trivial, o profundo. E para aprender, em conjunto, a usar melhor esse mundo de possibilidades. Espero ansiosamente para dar esse "like".

"Estamos em 2012 e ainda tem gente que acha que faz parte de um clubinho. A internet é mesmo capaz dessas contradições: é agregadora, mas também é exclusivista e excludente"

Jornalistas ameaçam agredir repórter do 'CQC' em Brasília

Maurício Meirelles participa do Bate-papo UOL

Famoso pelas confusões que costuma arrumar com seguranças, o “CQC” inovou nesta segunda-feira ao se meter numa encrenca com repórteres do primeiro time, no Itamaraty, em Brasília.
Credenciado para acompanhar o encontro de  Hillary Clinton com o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, o repórter do “CQC” Mauricio Meirelles provocou a fúria dos jornalistas ao final da entrevista, ao se levantar e oferecer uma máscara de Carnaval à secretária de Estado americano.
O encontro estava sendo transmitido ao vivo pela Globo News quando ocorreu o incidente. Meirelles já havia causado irritação ao gritar “I love you, Hillary” enquanto cinegrafistas registravam, dentro do Itamaraty, a chegada da secretária.
Hillary e Patriota, deixando o local, ouviram espantados parte da troca de ofensas entre a equipe do “CQC” e jornalistas que se sentiram prejudicados pela intervenção de Meirelles. Houve até quem gritasse: “Isto não é palhaçada! O que a imprensa do resto do mundo vai dizer do Brasil?”
Em seu Twitter, Meirelles contou: “Um dos jornalistas me chamou pra porrada e ameaçou meu produtor. Foi onde tudo começou”. Quem estava perto ouviu o repórter do “CQC” responder: “Vamos lá fora então”.
Havia cerca de 100 jornalistas presentes na entrevista. Segundo o repórter Mauricio Savarese, do UOL, Claudia Bomtempo, da Rede Globo, disse aos colegas que fez “uma reclamação formal” contra Meirelles junto à assessoria do Itamaraty.
Savarese conta que Hillary não se incomodou com a oferta da máscara de Carnaval. “Alguém pega para mim”, ela pediu, deixando o evento. Na sequência, Meirelles pegou um charuto e ofereceu à secretária de Estado. “Vingança ao Bill Clinton”, gritou o repórter do “CQC”, numa referência ao caso extraconjugal do então presidente americano com a estagiária Monica Levinsky.
Por confusões semelhantes, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) parou de credenciar repórteres do “CQC” para seus eventos em 2010.
No programa exibido na segunda-feira, o “CQC” exibiu uma intervenção de Mauricio Meirelles durante entrevista concedida por Pelé. O repórter interrompeu o evento para entregar uma camisa da seleção da Argentina ao ex-jogador.
O programa possivelmente deve fazer referência ao episódio ocorrido no Itamaraty na próxima segunda-feira.

J. K. Rowling prepara enciclopédia sobre Harry Potter

Projeto foi anunciado pela escritora em seu site oficial, ainda sem previsão de lançamento

Foto: Getty Images
J.K. Rowling é a autora dos livros "Harry Potter"
Foto: Reprodução
Até junho de 2011, a série de livros do bruxo vendeu cerca de 450 milhões de cópias no mundo todo
Fãs de Harry Potter, fiquem atentos! A escritora inglesa J. K. Rowling confirmou no último final de semana que está preparando uma enciclopédia sobre a saga. "Por muito tempo prometi que faria um livro assim, e agora comecei a trabalhar nele", disse ela em uma seção de perguntas no seu site oficial.
A escritora inglesa ainda comentou que um pouco deste conteúdo está disponível no site Pottermore , e que, quando terminado, os royalties do projeto serão doados para caridade. Entretanto, os pottermaníacos ainda terão de esperar um pouco: no momento, Rowling está focada em seu primeiro livro adulto. "The Casual Vacancy", ainda sem tradução em português, tem lançamento previsto para 27 de setembro.
Em março, outra novidade animou os fãs do bruxinho. Na Inglaterra, foram abertos para visitação os estúdios onde foram gravados os filmes da saga. O passeio fica em Hertfordshire, a vinte minutos de Londres, custa entre R$60 e R$80, e inclui visitas ao salão comunal da Grifinória, o Beco Diagonal e a sala de Dumbledore.

As oportunidades estão abertas

O portal de notícias Huffington Post ganhou um Pulitzer, prêmio mais respeitado na área de jornalismo. No ano passado, o site publicou uma série de reportagens - Beyond the Battlefield  – sobre histórias de veteranos do exército americano feridos nas guerras do Iraque e do Afeganistão.
A série de matérias, que chegou a se transformar em um ebook, faz uso de vídeos, fotos, infográficos e integração com plataformas de redes sociais.
É um tipo de jornalismo diferente do que o HuffPost tradicionalmente faz – focado demais em ser viral e atraente para os mecanismos de buscas. Aliás, David Wood, veterano jornalista responsável pelas reportagens faz parte da pequena equipe de profissionais pagos pelo HuffPost e não dos numerosos “blogueiros convidados” que não recebem remuneração financeira pelo seu trabalho.
O HuffPost não é a primeira publicação com DNA 100% digital a receber o prêmio. Em 2010, a organização ProPublica, em parceria com a NYTimes Magazine, levou o Pulitzer para a redação.
O recebimento do prêmio mostra o quanto a internet trouxe novas marcas ao jornalismo. Algo que historicamente é bem comum. Sempre quando surge uma nova plataforma ou dispositivo de distribuição de conteúdo, novas marcas nascem.
Há 15 anos quem imaginaria que o Huffington Post se tornaria uma importante marca na área de jornalismo, chegando a receber um Pulitzer?
O prêmio dedicado ao HuffPost tem um outro componente interessante – em mostrar que oportunidades estão abertas e que o discurso “velha mídia” versus “novas mídias” não encontra mais espaço.
Assim como o Pulitzer não é algo mais restrito a estabelecidas empresas de jornalismo, ferramentas como blogs, infográficos online e plataformas de redes sociais não são e nunca foram de uso exclusivo das novas empresas de mídia. Apesar da aura mágica criada em torno delas, são ferramentas acessíveis a todas organizações – novas e tradicionais empresas de jornalismo.
O HuffPost soube muito bem utilizá-las e conquistou um Pulitzer. Da mesma forma, empresas tradicionais podem fazer o mesmo. Guardian e NYTimes, por exemplo, vêm integrando essas ferramentas ao dia a dia, com usos melhores do que o de muita empresa nova e descolada de mídia.
Um outro exemplo vem do próprio HuffPost. Junto com o recebimento do prêmio de jornalismo, o site anunciou que lançará uma revista semanal exclusiva para tablets. Há um bom tempo “fazer revista” deixou de ser algo exclusivo de empresas estabelecidas. As possibilidades agora estão abertas.

domingo, abril 01, 2012

Dicas de redação

Professor dá dicas de redação

A experiência dos editores


Jorge Viveiros de Castro, Martha Ribas e Marcos da Veiga Pereira contam histórias e estratégias de suas editoras em um curso sobre mercado editorial


Se pensarmos de forma simplificada, até um livro chegar na mão dos leitores ele passa por várias etapas: é escrito, revisado, ganha capa e ilustrações, é impresso e chega às livrarias com uma série de estratégias de marketing que podem ajudar em sua venda. Por trás de todas estas delicadas escolhas, está o olhar atento dos editores, determinante para que um título dê certo ou fique esquecido em um canto de prateleira na livraria ou, pior, encalhado em um depósito. Mas será que os editores são mesmo determinantes nesse processo? A provocação sobre o papel dos editores e outras questões sobre o tão discutido futuro do livro serão colocadas em pauta por Marcos da Veiga Pereira, da Sextante; Jorge Viveiros de Castro, da 7Letras e Martha Ribas, da Casa da Palavra,  no curso "Mercado editorial: experiências de sucesso e novas oportunidades", a partir de segunda-feira, no Polo de Pensamento Contemporâneo ( Rua Conde Afonso Celso 103). Além da troca de experiências, os editores vão comentar novidades como a abertura de um "showroom" da 7Letras em Ipanema e o lançamento do selo Fantasy-Casa da Palavra.

A história de Marcos Pereira, editor da Sextante e que dará a primeira aula do curso no dia 2, se confunde com a dos negócios da família - ele é neto de José Olympio, fundador da editora que ainda leva seu nome,  e filho de Geraldo Jordão Pereira, que criou a Salamandra, em 1981, hoje pertencente à Moderna. Para ele, a função quase curatorial do trabalho do editor não está sumindo, apenas passando por  mudanças, assim como a relação das pessoas com a leitura, com a forma de comprar livros.

- Futurologia não dá para fazer. Essa questão do futuro da indústria editorial versus o futuro do livro é incerta, mas gosto de pensar o seguinte: antigamente havia apenas o comércio de livros físicos, havia uma preocupação com a edição, com a capa. Agora e no futuro ele será apenas um download em um tablet, no Kindle, e a função do editor entra em cheque. Mas editor é só um cara que vai pegar o dinheiro, imprimir o livro, vai trabalhar na distribuição, ou seja, vai virar um sócio? Ou o editor é alguem que tem uma sensibilidade em relação ao texto, em relação ao mercado, interfere e ajuda o autor a construir o projeto dele? - questiona Pereira.
A Sextante  sempre teve uma atuação forte no setor de livros de autoajuda, mantém desde 2007 uma parceria com a Íntrinseca e lançou, em 2011, o selo Primeiro Pessoa, dedicado a obras de não ficção com ênfase em biografias. A editora está na lista dos mais vendidos com um livro sobre o empresário Eike Batista, e se prepara para lançar ainda este ano uma biografia do lutador Anderson Silva.

A criação de selos tem sido uma forma de se expandir não só nas prateleiras e para outros públicos, uma forma de chegar a nichos editoriais que vem ganhando cada vez mais espaço no mercado, como os livros de fantasia. A Casa da Palavra, fundada há 15 anos, se consolidou com um perfil editorial voltado para publicações e guias sobre a cultura brasileira e particularmente a carioca. No entanto, de acordo com a editora Martha Ribas, se reinventar faz parte da dinâmica do mercado e a Casa, associado ao grupo português Leya desde o ano passado, também está lançando um selo, o Fantasy- Casa da Palavra.  O primeiro título será "John Carter: entre dois mundos", de Stuart Moore, baseado na obra de Edgard Burroughs. A crise de identidade editorial passou longe de Martha.

- Eu pensava que os livros tinham que se relacionar um com o outro, que tinham que construir uma teia de aranha, mas acabava esquecendo que poderia lançar boas histórias que o público quer ler - conta Martha. - É um novo mundo novo que estou adentrando com alegria, me divertindo, conhecendo o público, aprendendo como eu vou divulgar. Estou começando a entender os estilos dentro de fantasia, que tem subgêneros como a fantasia urbana, elfos, fadas, bruxas. É um gênero que eu não lançava, não lia e que estou me divertindo e vibrando em conhecer. É uma área que eu até via com preconceito. E o mercado em si está muito competitivo, está todo mundo em cima dos livros de fantasia, com olheiro para achar os títulos.


Expectativa para a vinda da Amazon
Para acompanhar o crescimento do mercado, a criação de selos e a junção de grupos parece não ser suficiente. Um dos temas que será abordado no curso é a experiência com livros digitais e a chegada ao Brasil, prevista para o segundo semestre, da loja virtual Amazon, maior empresa de comércio eletrônico do mundo e criadora do leitor digital Kindle (especula-se que o dispositivo seja vendido no Brasil por R$200 em média). O assunto também cria expectativas entre os editores que, ainda com um pé atrás e outro adiante, levantam hipóteses cautelosas sobre como o Brasil reagirá. O editor da 7Letras e escritor Jorge Viveiros de Castro, que começou publicando poesias, revistas literárias e expandiu para livros acadêmicos, é otimista em relação à chegada da Amazon.

- O Brasil está começando a produzir, mas o resultado é quase nulo ainda. Acho que tem o problema do preço, tem a competição com o próprio livro físico e, na verdade, não existe o mercado do livro digital no Brasil, há alguns que vendem, alguns poucos outros que compram. Ainda está para chegar, não chegou -  observa Viveiros de Castro, que faz um trabalho quase marginal ao mercado e começou a disponibilizar livros digitais do catálogo da editora no ano passado. - Os tablets custam caro e para produzir e criar os mecanismos comerciais de funcionamento desse produto ainda é muito obscuro, ainda está no berço no Brasil, mas eu não vejo com medo, não acho que seja o fim do livro. É um espaço a mais para as publicações.
O editor no momento diz estar "em obras" porque se prepara para abrir um "showroom"  que vai reunir, em Ipanema, livros da 7Letras e também de outras editoras.  A previsão de abertura será em abril e Viveiros de Castro promete revelar mais  detalhes no curso, onde dará aula no dia 9.
Em relação à vinda da gigante Amazon para o Brasil, Pereira ressalta as diferenças entre os mercados editorais do Brasil e dos Estados Unidos e diz que no futuro, quando os livros digitais tiverem realmente expressão no mercado editorial do país, os preços terão que ser revistos:
- O modelo que foi criado nos Estados Unidos parece muito complicado para a indústria brasileira, há uma disputa muito clara entre os canais de venda, como a Amazon, por exemplo, e os editores, sobre quem é que determina as condições no mercado. Quando passarmos por uma transição total,  se ela acontecer, entre o livro físico e o livro digital, talvez essa questão do preço seja completamente revista. O grande desafio dos mercados editoriais em Espanha, Alemanha, Brasil, Itália é criar um modelo de livro digital que preserve a indústria como um todo, a individualidade do autor e o trabalho do editor.

A ditadura civil-militar


Por Daniel Aarão Reis*

 Tornou-se um lugar comum chamar o regime político existente entre 1964 e 1979 de “ditadura militar”. Trata-se de um exercício de memória, que se mantém graças a diferentes interesses, a hábitos adquiridos e à preguiça intelectual. O problema é que esta memória não contribui para a compreensão da história recente do país e da ditadura em particular.

É inútil esconder a participação de amplos segmentos da população no golpe que instaurou a ditadura, em 1964. É como tapar o sol com a peneira.

As marchas da Família com Deus e pela Liberdade mobilizaram dezenas de milhões de pessoas, de todas as classes sociais, contra o governo João Goulart. A primeira marcha realizou-se em São Paulo, em 19 de março de 1964, reunindo meio milhão de pessoas. Foi convocada em reação ao Comício pelas Reformas que teve lugar uma semana antes, no Rio de Janeiro, com 350 mil pessoas. Depois houve a Marcha da Vitória, para comemorar o triunfo do golpe, no Rio de Janeiro, em 2 de abril. Estiveram ali, no mínimo, a mesma quantidade de pessoas que em São Paulo. Sucederam-se marchas nas capitais dos estados e em cidades menores. Até setembro de 1964, marchou-se sem descanso. Mesmo descontada a tendência humana a aderir à Ordem, trata-se de um impressionante movimento de massas.


Nas marchas desaguaram sentimentos disseminados, entre os quais, e principalmente, o medo, um grande medo.

De que as gentes que marcharam tinham medo?

Tinham medo das anunciadas reformas, que prometiam acabar com o latifúndio e os capitais estrangeiros, conceder o voto aos analfabetos e aos soldados, proteger os assalariados e os inquilinos, mudar os padrões de ensino e aprendizado, expropriar o sistema bancário, estimular a cultura nacional. Se aplicadas, as reformas revolucionariam o país. Por isto entusiasmavam tanto. Mas também metiam medo. Iriam abalar tradições, questionar hierarquias de saber e de poder. E se o país mergulhasse no caos, na negação da religião? Viria o comunismo? O Brasil viraria uma grande Cuba? O espectro do comunismo. Para muitos, a palavra era associada à miséria, à destruição da família e dos valores éticos.

É preciso recuperar a atmosfera da época, os tempos da Guerra Fria. De um lado, os EUA e o chamado mundo livre, ocidental e cristão. De outro, a União Soviética e o mundo socialista. Não havia espaço para meios-termos. A luta do Bem contra o Mal. Para muitos, Jango era o Mal; a ditadura, se fosse o caso, um Bem.

No Brasil, estiveram com as Marchas a maioria dos partidos, lideranças empresariais, políticas e religiosas, e entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), as direitas. A favor das reformas, uma parte ponderável de sindicatos de trabalhadores urbanos e rurais, alguns partidos, as esquerdas. Difícil dizer quem tinha a maioria. Mas é impossível não ver as multidões — civis — que apoiaram a instauração da ditadura.

A frente que apoiou o golpe era heterogênea. Muitos que dela tomaram parte queriam apenas uma intervenção rápida, brutal, mas rápida. Lideranças civis como Carlos Lacerda, Magalhães Pinto, Adhemar de Barros, Ulysses Guimarães, Juscelino Kubitschek, entre tantos outros, aceitavam que os militares fizessem o trabalho sujo de prender e cassar. Logo depois se retomaria o jogo politico, excluídas as forças de esquerda radicais.

Não foi isso que aconteceu. Para surpresa de muitos, os milicos vieram para ficar. E ficaram longo tempo. Assumiram um protagonismo inesperado. Houve cinco generais-presidentes. Ditadores. Eleitos indiretamente por congressos ameaçados, mas participativos. Os três poderes republicanos eram o Exército, a Marinha e a Aeronáutica. Os militares mandavam e desmandavam. Ocupavam postos no aparelho de segurança, nas empresas estatais e privadas. Choviam as verbas. Os soldos em alta e toda a sorte de mordomias e créditos. Nunca fora tão fácil “sacrificar-se pela Pátria”.

E os civis? O que fizeram? Apenas se encolheram? Reprimidos?

A resposta é positiva para os que se opuseram. Também aqui houve diferenças. Mas todos os oposicionistas — moderados ou radicais — sofreram o peso da repressão.

Entretanto, expressivos segmentos apoiaram a ditadura. Houve, é claro, ziguezagues, metamorfoses, ambivalências. Gente que apoiou do início ao fim. Outros aplaudiram a vitória e depois migraram para as oposições. Houve os que vaiaram ou aplaudiram, segundo as circunstâncias. A favor e contra. Sem falar nos que não eram contra nem a favor — muito pelo contrário.

Na história da ditadura, como sempre, a coisa não foi linear, sucedendo-se conjunturas mais e menos favoráveis. Houve um momento de apoio forte — entre 1969 e 1974. Paradoxalmente, os chamados anos de chumbo. Porque foram também, e ao mesmo tempo, anos de ouro para não poucos. O Brasil festejou então a conquista do tricampeonato mundial, em 1970, e os 150 anos de Independência. Quem se importava que as comemorações fossem regidas pela ditadura? É elucidativa a trajetória da Aliança Renovadora Nacional — a Arena, partido criado em 1965 para apoiar o regime. As lideranças civis aí presentes atestam a articulação dos civis no apoio à ditadura. Era “o maior partido do Ocidente”, um grande partido. Enquanto existiu, ganhou quase todas as eleições.

Também seria interessante pesquisar as grandes empresas estatais e privadas, os ministérios, as comissões e os conselhos de assessoramento, os cursos de pós-graduação, as universidades, as academias científicas e literárias, os meios de comunicação, a diplomacia, os tribunais. Estiveram ali, colaborando, eminentes personalidades, homens de Bem, alguns seriam mesmo tentados a dizer que estavam acima do Bem e do Mal.

Sem falar no mais triste: enquanto a tortura comia solta nas cadeias, como produto de uma política de Estado, o general Médici era ovacionado nos estádios.

Na segunda metade dos anos 1970, cresceu o movimento pela restauração do regime democrático. Em 1979, os Atos Institucionais foram, afinal, revogados. Deu-se início a um processo de transição democrática, que durou até 1988, quando uma nova Constituição foi aprovada por representantes eleitos. Entre 1979 e 1988, ainda não havia uma democracia constituída, mas já não existia uma ditadura.

Entretanto, a obsessão em caracterizar a ditadura como apenas militar levou, e leva até hoje, a marcar o ano de 1985 como o do fim da ditadura, porque ali se encerrou o mandato do último general-presidente. A ironia é que ele foi sucedido por um politico — José Sarney — que desde o início apoiou o regime, tornando-se ao longo do tempo um de seus principais dirigentes…civis.

Estender a ditadura até 1985 não seria uma incongruência? O adjetivo “militar” o requer.

Ora, desde 1979 o estado de exceção, que existe enquanto os governantes podem editar ou revogar as leis pelo exercício arbitrário de sua vontade, estava encerrado. E não foi preciso esperar 1985 para que não mais existissem presos políticos. Por outro lado, o Poder Judiciário recuperara a autonomia. Desde o início dos anos 1980, passou a haver pluralismo politico-partidário e sindical. Liberdade de expressão e de imprensa. Grandes movimentos puderam ocorrer livremente, como a Campanha das Diretas Já, mobilizando milhões de pessoas entre 1983-1984. Como sustentar que tudo isto acontecia no contexto de uma ditadura? Um equívoco?

Não, não se trata de esclarecer um equívoco. Mas de desvendar uma interessada memória e suas bases de sustentação.

São interessados na memória atual as lideranças e entidades civis que apoiaram a ditadura. Se ela foi “apenas” militar, todas elas passam para o campo das oposições. Desde sempre. Desaparecem os civis que se beneficiaram do regime ditatorial. Os que financiaram a máquina repressiva. Os que celebraram os atos de exceção. O mesmo se pode dizer dos segmentos sociais que, em algum momento, apoiaram a ditadura. E dos que defendem a ideia não demonstrada, mas assumida como verdade, de que a maioria das pessoas sempre fora — e foi — contra a ditadura.

Por essas razões é injusto dizer — outro lugar comum — que o povo não tem memória. Ao contrário, a história atual está saturada de memória. Seletiva e conveniente, como toda memória. No exercício desta absolve-se a sociedade de qualquer tipo de participação nesse triste — e sinistro — processo. Apagam-se as pontes existentes entre a ditadura e os passados próximo e distante, assim como os desdobramentos dela na atual democracia, emblematicamente traduzidos na decisão do Supremo Tribunal Federal em 2010, impedindo a revisão da Lei da Anistia. Varridos para debaixo do tapete os fundamentos sociais e históricos da construção da ditadura.

Enquanto tudo isso prevalecer, a História será uma simples refém da memória, e serão escassas as possibilidades de compreensão das complexas relações entre sociedade e ditadura.

Leia mais: Faces da ditadura

ENCERRADAS INSCRIÇÕES PARA O CURSINHO PRÉ-VESTIBULAR DA AJAP E ABERTAS PARA O PROJETO DE INCLUSÃO DIGITAL


A assessoria de comunicação da AJAP – Associação Amigos de Jardim de Piranhas - informa que, devido a grande procura pelo Cursinho Pré-vestibular, a direção da associação decidiu encerrar temporariamente as inscrições, para poder fazer uma avaliação do perfil econômico e social dos inscritos e definir a relação dos beneficiários do Projeto.
De acordo com o professor Francisco Borges, coordenador do cursinho pré-vestibular: “as inscrições pararam porque a procura foi acima do esperado, sinalizando que estamos certos da enorme carência do jovem de Jardim por um cursinho pré-vestibular, como também demonstrou que os jovens acreditaram na seriedade do grupo que está à frente do Projeto”.
A assessoria informa ainda que as inscrições do Projeto de Inclusão Digital estão abertas para jovens carentes que desejam aprender informática e se inserir no mundo da informação.
Além do Projeto de Inclusão Digital, a AJAP vai possibilitar ao jovem a oportunidade de aprender a profissão de manutenção de computadores, através do seu Laboratório de Informática.
O Instrutor, Rafael Andreolla, informa que as inscrições terão um prazo muito curto, devido a procura no processo de pré-incrição ter sido acima da espectativa da direção da AJAP.

Flores secas do cerrado

Conto de Milton Hatoum


Ilustração: Ramon Muniz
Há pessoas que falam menos que um papagaio, seres silenciosos ou de poucas palavras, mas em Brasília até as paredes emitem estalos suspeitos. Silêncio, mesmo, só na lonjura, no cerrado original. Na parede do quarto do hotel observo um origami com dobras geométricas. Da janela posso ver árvores desfolhadas com galhos retorcidos, o gramado marrom, o horizonte queimado pela seca de setembro. No centro da paisagem calcinada, a praça dos Três Poderes… Dizem que a nova Biblioteca de Brasília foi inaugurada sem livros. Será uma metáfora da cabeça de tantos políticos? Ou do tempo em que vivemos?
A arrumadeira do hotel é uma mulher de Minas; o recepcionista, um rapaz pernambucano, um dos ajudantes do chef de cozinha, baiano. O Brasil todo está aqui, e esse Brasil de verdade parece ausente nas esculturas côncava e convexa do Congresso Nacional. Cada vez que entro no elevador minha cabeça se enche de sons de pássaros. Cantam e não aparecem: onde estão? Não há pássaros nas imagens do Pantanal e da Amazônia coladas nas paredes do elevador panorâmico. Mas quando subo ou desço dezessete andares, sou obrigado a ouvir trinados metálicos na caixa de vidro e aço. Lembro do conto Paolo Uccelo, do escritor francês Marcel Schwob. O genial artista florentino do Quattrocento era obcecado por pássaros, pela geometria e perspectiva. Uccello queria entender o mundo (o espaço) em profundidade. As paredes de seu ateliê eram cobertas de pássaros pintados por Uccello, daí seu apelido e o título do conto de Schwob. Mas a vida não é imaginária, nem sempre é, sobretudo quando o elevador pára no térreo e o cronista se senta à mesa do café da manhã e ouve pedaços de conversas indiscretas:
— Volto na próxima semana por causa do resultado da licitação…
— Acertei com o senador, só falta…
— Consegui marcar uma audiência, agora vai ser mais fácil…
A mulher de Minas ganha menos de dois salários mínimos e mora em Samambaia, uma das favelas do Distrito Federal. Na época em que morei em Brasília ninguém dizia favela, e sim cidade-satélite. Esse eufemismo urbano ainda persiste, mas tende a desaparecer e sumir de vez. O plano piloto da nova capital foi construído sob o signo da miséria brasileira: os candangos pobres, operários, artesãos e desempregados migraram de todos os quadrantes e foram morar na periferia da cidade-monumento projetada por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer. Como seria o Brasil ou Brasília se não houvesse existido o golpe militar e vinte e cinco anos de ditadura? Sem essa noite longa e infame, o país teria avançado socialmente? Haveria tanta miséria? A educação pública de qualidade — um sonho obstinado de Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro — seria melhor? A interrupção da democracia foi um desastre, o toque militar de recolher, um retrocesso.
O ajudante do chef de cozinha ganha mais do que a mulher de Minas e mora em Sobradinho.
— Se eu não comesse no hotel, passaria fome. Meus dois meninos são filhos da Capital.
Gêmeos da era Collor, vieram ao mundo durante um pesadelo político. Sobradinho. Nunca me esqueci das cidades-satélites, para aonde íamos pichar muros com slogans contra a censura e a brutalidade. Por onde andam meus amigos daquela época? Zé Wilson, o Cuca, viajou ainda jovem para o outro lado do espelho, nem me deu adeus. Ainda me lembro do entusiasmo com que comentava os clássicos; lia tudo e nos olhava por trás de lentes grossas no rosto de criança. Chico dos Anjos, filho do escritor Cyro dos Anjos, também partiu antes do tempo. Disse ao Chico que O amanuense Belmiro era um belo romance. Como os mineiros escrevem bem, de dar inveja, acrescentei. Percebi uma ponta de orgulho no olhar do meu amigo. Depois ele deu uma gargalhada. O Chico ria quando todos ficavam sérios, não era tempo de risadas, mas ele tinha humor, e um astral na lua.
Nada era muito asséptico em Brasília, uma cidade embrionária, capital pequena. E vigiada. Poucos homens usavam terno e gravata, a maioria ostentava farda e metais, uma poeira vermelha cobria as superquadras, manchava as fachadas dos ministérios, as mãos de concreto armado, mãos abertas da Catedral então inacabada. A poeira barrenta manchava o Palácio do Planalto. O outro, da Alvorada, também avermelhava. Barro subversivo, os milicos diziam ou deviam dizer. Barro maldito. Até o barro primordial do cerrado era comunista. O setor hoteleiro era acanhado, lembro das duas noites em que dormi no hotel das Nações, noites de angústia, meu coração moído de saudades do Norte. Depois fui morar num dos quartos de uma casa na Avenida W-3 Sul. Aluguel barato de uma pensão informal. Uma família de negros: o pai era um mestre de obras baiano, candango de primeira mão. Hotel das Nações, inaugurado em 1962. Que belo nome para uma nação esperançosa, antes do desespero. As casas da W-3 já estão desfiguradas. Tinham um pátio nos fundos, que podia ser um quintal. Duas crianças brincavam de cabra-cega ao redor da pitangueira, e um dia ganhei de uma delas um punhado de frutas e comecei a gostar de Brasília. Agora os pátios foram cobertos por puxadinhos, ocupados por quartos amontoados, coisa de cortiço. As famílias cresceram, a renda caiu, os proprietários alugam os fundos da casa. Nem Brasília, planejada e construída com capricho, resistiu ao caos urbano-arquitetônico. A miséria e suas favelas cercam os três poderes da república, o medo e a violência de ontem voltaram com outra feição. Chico dos Anjos, Cuca, vocês não viram isso. João Luiz Lafetá, um crítico fino e sofisticado, você morou em Brasília naquela época e também partiu sem ver o país subtraído de uma esperança teimosa, tão brasileira. João Alexandre Barbosa, outro amigo, crítico dos mais eruditos, também nos deixou. Ele pediu demissão da Universidade de Brasília quando dezenas de professores foram expulsos dessa instituição no fim da década de 1960. Ele continuou sua carreira docente na USP, mas a UnB resistiu, sobreviveu. Penso em vocês enquanto escuto trinados metálicos de pássaros ausentes. Dezessete andares em trinta segundos. Melhor caminhar a esmo, rever Brasília no escuro, de madrugada. Saio da jaula de aço e vidro e vejo na recepção duas mulheres falsamente louras que conversam com lobistas e sentam em poltronas forradas de couro; elas pedem uísque, talvez faturem por noite o que a mulher de Minas ganha por mês, e o parceiro lobista ganhará mais do que todas as prostitutas e outras mulheres trabalhadoras ganhariam em dez anos de labuta.
O origami na parede não me diz nada, é mais um ornato num quarto de hotel que poderia estar nas Filipinas, na Holanda ou África do Sul. Faço uma viagem à deriva pelo cerrado, quero encontrar um lugar do passado, o Poço Azul, onde me refugiava do medo e dos homens. É uma viagem no tempo. Aqui há pássaros de verdade, posso encontrar uma trégua para o pesadelo, abraçar o sono da solidão e a memória de um desejo apagado por décadas. A paisagem é bela e áspera: árvores anãs com galhos retorcidos, braços tortos de seres vegetais, trágicos. Aqui o passado não lanha meu corpo nem minha alma, posso colher flores secas do cerrado e escrever esta crônica de amor a uma cidade que não sai de mim.

Uma vida ao lado de Chico Anysio

Fonte:  Artur Xexéo 


Passei a vida toda me divertindo com Chico Anysio. Literalmente. Eu não tinha completado ainda 10 anos de idade, quando conheci Valentino, o personagem que ele interpretava, todo sábado à noite, na TV Rio, na “Praça da Alegria”. Valentino era um garoto ingênuo que não percebia as investidas de Lolita (a vedete Mara Di Carlo), uma menina da sua idade, mas muito mais esperta. Quando chamavam a sua atenção para o fato de ele estar sendo assediado pela garota, Valentino desconversava dizendo "Eu sou criança, eu não sou de nada". E encerrava o quadro — era asim que a gente chamava os esquetes naquele tempo —, fazendo voar seu aviãozinho de brinquedo, ao mesmo tempo em que dizia o bordão “Lá vai o Caravelle.”

Era uma graça infantil que, não por acaso, transformou Chico Anysio em ídolo da garotada daquele tempo. Não demorou muito tempo para eu descobrir que, além de grande comediante, Chico Anysio também era mágico. Porque era pura magia o que ele fazia, agora nas noites de domingo, no “Chico Anysio Show”. Chico já fazia mais de um personagem, nas noites de terça-feira, no programa “Eta Nordeste da peste”. Mas, no show de domingo, era um escândalo. Em uma hora de programa, ele mostrava mais de uma dezena de
personagens. Mais mágico ainda: muitas vezes, um dos personagens contracenava com outro. Como é que podia? Chico Anysio, ao lado do diretor Carlos Manga, foi o primeiro artista brasileiro a ver as possibildades do videoteipe, uma novidade da época. E nós fomos ficando íntimos do Alfacinha (“Antonio Alfacinha, aqui está meu cartão”), do Santelmo (“tem que ser que nem que eu sou: durão”), do Seu Urubulino e, principalmente, do Coronel Limoeiro, aquele que nunca percebia que era traído pela mulher, Maria Tereza (Zelia Hoffman): “Maria Tereza? Isso me ama!”

Já estava mais grandinho quando conheci outra faceta de Chico, a do ator de teatro. Se na televisão ele se desdobrava em muitos personagens de características completamente distintas, ele nos atraía ao teatro mostrando-se diferente: de cara lavada, sem figurinos, sem mudanças de voz. Era humor em forma pura. Não foi Chico quem inventou a "stand up comedy" no Brasil. José Vasconcelos tinha chegado antes. Mas enquanto Vasconcelos era mais gaiato, investindo num humor popular, Chico sofisticava a graça em suas apresentações teatrais. Era sensacional. Não foi por acaso que a "stand up comedy" custou a pegar por aqui. Na ocasião, por sinal a gente nem chamava o gênero desta maneira. Era "one man show". A língua portuguesa sempre foi muito criativa. Mas com um modelo como Chico Anysio, era muito arriscado enfrentar o gênero. Só outro gênio da comédia, Jô Soares, foi pelo  mesmo caminho. O padrão de "stand up" deixado pela dupla era alto demais para ter seguidores.

Desde “Chico Anysio só”, o primeiro de seus espetáculos, foram muitas as temporadas de Chico no já extinto Teatro da Lagoa. E sempre com casa lotada. Foi mais ou menos o humor que fazia no teatro que Chico levou para seu quadro no “Fantástico”, que também ficou muitos anos em cartaz.

Já adulto, continuei admirando Chico na “Escolinha do professor Raimundo”. O professor nunca foi meu personagem favorito, mas era um exemplo da genorosidade do ator. O personagem não tinha muitas piadas. Ele servia como escada para a inacreditável turma de comediantes que representava seus alunos. E ali a minha geração tinha a chance de reencontrar alguns de seus ídolos da infância como Ary Leite, Zezé Macedo, Antônio Carlos, Nádia Maria, Walter D’Ávila, Nélia de Paula, Costinha... Enquanto a “Escolinha” esteve no ar, não houve um só comediante brasileiro desempregado.

A profissão de jornalista me deu oportunidade de conhecer muitos dos meus ídolos. Chico foi um deles. Trabalhava numa revista semanal, quando ele viveu uma de suas inúmers temporadas de sucesso com esse ou aquele personagens de um dos muitos shows que comandou na Rede Globo. O personagem da ocasião era o preguiçoso Painho, o pai de santo baiano que sofria de “dor nos quartos”. A revista resolveu dar uma capa para ele. E lá fui eu entrevistar Chico, além de acompanhar a gravação de um de seus programas. O ator me recebeu em sua casa depois de uma jornada de trabalho que incluiu, além da grava-
ção do programa, os arremates num livro e os preparativos para uma turnê com um dos espetáculos teatrais que fazia sozinho.

Chico tinha o defeito de ser criativo demais. Ele elaborava roteiros de cinema, escrevia romances, compunha canções, era dramaturgo, atuava em filmes, fazia crônicas... tudo isso sem se esquecer do jeito, da voz, da postura dos seus 154 personagens — alguém sabe mesmo quantos ele criou? —, pois volta e
meia ressuscitava um ou outro.

Chico nunca foi só um. E não estou falando apenas dos seus muitos personagens. A cada morte, o mundo comprova a máxima de que ninguém é insubstituível. Mas agora é preciso abrir uma exceção. Ninguém é insubstituível. A não ser Chico Anysio.

A Comissão da Verdade contra as mentiras

Elio Gaspari, O Globo

A Comissão da Verdade não poderá rever a Lei da Anistia, mas poderá desmontar quase meio século de mentiras com as quais os brasileiros são obrigados a conviver. Quem tem hoje menos de 43 anos ainda não nascera em 1969, quando a tortura foi transformada em política de Estado pela ditadura.
O conflito do século passado não faz parte do seu mundo, mas as mentiras ofendem-lhe a inteligência, mutilando o direito que uma sociedade tem de saber o que aconteceu no seu país. Saber, só saber.
As mentiras não persistem em nome da pacificação dos ânimos. Acima de tudo, foram e são o exercício de um poder que busca o bloqueio da lembrança. Dilma Rousseff reconhece que participou de uma organização que matou gente que nada tinha a ver com sua luta (o caso do major alemão que foi confundido com um capitão boliviano, assassinado no Rio em 1968). Por conta dessa militância, ela foi presa, torturada e pagou três anos de cárcere.
Os torturadores e assassinos que participaram do combate a essas organizações cumpriram ordens e, em muitos casos, foram condecorados e continuam protegidos por um manto de silêncio. Em seu governo, Fernando Henrique Cardoso reconheceu a responsabilidade do Estado nesses crimes, mas falta responder a perguntas que completarão meio século de silêncio.
Tome-se um exemplo, o do segredo em torno do que aconteceu no combate à Guerrilha do Araguaia.
Em 1972 o Exército soube que havia naquelas matas um projeto de foco guerrilheiro do PCdoB. Eram cerca de 70 militantes. A tropa chegou em abril e, até dezembro, capturou oito guerrilheiros, entre eles, José Genoino, atual assessor do ministro da Defesa.
Nesse período, morreram 12 combatentes da organização comunista, e oito foram capturados. Processados e condenados pela Justiça Militar, cumpriram suas penas e foram libertados.
Em outubro de 1973 o Exército iniciou uma nova operação. Depois do Natal não havia mais guerrilha. Restavam apenas fugitivos, e só dois escaparam. Um era o comandante militar do foco, o outro, seu guia. O efetivo do PCdoB ficou reduzido a algo como 35 militantes.
A mentira impõe aos brasileiros a ideia de que eles desapareceram. Só um foi visto morto. Talvez tenham sido recolhidos numa clareira por um disco voador albanês.

Millôr: do riso e da amargura. Crônica deste fim de semana no Globo



 Não posso falar de Millôr Fernandes  como amigo, igual a muitos colegas  que estão compondo homenagens,  sobretudo aqueles um pouco mais  velhos. Ironicamente, aliás, cresci ouvindo cobras  e lagartos a seu respeito. Entes próximos  e amados diziam que ele era inimigo da família  e que chamara publicamente meu tio de “Adolpho  Bloch Hitler”. 
Uma piada eticamente bem  arriscada para se fazer com um judeu, ainda  mais um judeu russo. Em sua tirania (alternada  com humildade extremada) Adolpho estava
mais para um híbrido de “Pedro, o Grande”  com Aleksei Ivánovitch, o protagonista de “O  jogador”, de Dostoievski.
   Mas fazer o quê?, ele se chamava Adolpho  (adaptação de Avram, seu nome de imigrante),  o que dava o mote: como é que Millôr ia perder  o trocadilho, ele que era o rei dos jogos de palavras  e que, mesmo com os amigos e até nos  mais rasgados elogios jamais perdia a oportunidade  de espinafrar o próximo?
Além disso, toda semana meu pai trazia o  “Pasquim”. Sejamos francos: não havia quem  não lesse o Millôr, fruindo do sabor agridoce da admiração temperada de mágoa.
   Claro que, à medida que começamos a nos  afastar da cartilha estrita da família (quando isso  é possível) passamos a fazer um juízo próprio  das pessoas, e, no meu caso, este foi se  construindo não através da relação pessoal, da  inflamação ideológica ou das birras tribais, mas do gosto pela obra. Mal completara 15  anos e, na onda da abertura lenta, gradual e irrestrita  e do fim da censura, assisti a “Os órfãos  de Jânio” no Teatro dos Quatro.
   Chorei com o retrato que Millôr ali fazia  das gerações que precederam a minha, cujos  feitos, heroicos ou não — fechado que estava no casulo familiar — eu não tinha a mais vaga consciência, a não ser por uns laivos em conversas cifradas com o Cony, um luminar que frequentava a casa.
   Chorei também com a “Marcha da Quartafeira de Cinzas”, de Vinicius e Lyra, que coroava o final da peça com a forte melancolia de suas palavras e aquele arrastão em tom menor, afeito às marchas-rancho. Cheio de fôlego juvenil, eu descobria no teatro tudo ao mesmo tempo: Millôr, Vianninha, Brecht, Ionesco. Os originais que xerocava na SBAT eram a minha bíblia de um Brasil desconhecido que mofava nos porões.
   Passei a ler tudo de Millôr e em pouco tempo consegui ficar próximo o suficiente (na qualidade de público) para sacar que seu humor, nos cartuns, no frasismo, nos desenhos, no teatro, no anedotário e nas sátiras era crivado por uma forte amargura da qual ninguém, nem ele,  escapava. É a mesma amargura que está em
sua expressão facial, semítica, aquele tipo de desgosto que ao mesmo tempo parece um sorriso.  Seria judaico se não fosse mouro.
   Ele mesmo captou esta particularidade fisionômica na sua autocaricatura, transformada em marca pictórica do seu pensamento, dublê
gráfico, porta-voz de si mesmo. Isso é que era bom em Millôr: não se faz omelete
sem quebrar ovos. Não se faz diferença apostando no senso comum, no aplauso de todos.
Se o veneno existe, ele está espalhado na corrente psicossocial da civilização e precisa ser destilado. Do contrário morreremos todos intoxicados pela mentira a respeito da nobreza de nossas almas e de sermos todos, sempre, bons e ilibados cidadãos.
   Os que assumem o papel de purgar o mal comum levam muito chumbo mas, se sobrevivem à linha de tiro, terminam por abrir espaços absolutamente novos, singulares, que, uma vez inaugurados, permanecem, como castelos de uma areia quase imune à arrebentação do mar e resistentes ao tempo e ao vento. Ao passo
que os arautos do óbvio-obscuro desaparecem com a primeira brisa.
   Só estive com Millôr pessoalmente em princípios dos anos 2000, num único jantar. Uma vez confirmado o encontro, passei momentos de ansiedade, de medo e até de culpa. Na hora H, com vinho e cavaquinha à mesa do hoje extinto Gibo, na Praça General Osório, ele me tratou com extrema cordialidade, mas me sacaneou um bocadinho, o que me honrou.
   Contou todo tipo de histórias, sorriu torto várias vezes e riu um riso esganado, gutural, que, por uma arrepiante ironia, lembrou-me o riso “mudo” de Adolpho, que era um choro. Os olhos de Millôr brilhavam, daquele brilho dos que, escaldados com a tal da amargura, amam a vida só pelo fato de ela existir e de proporcionar a chance de constatar a desgraceira que é.
   Passaram-se dez anos deste encontro. Foi a última vez que vi Millôr. Sua partida trouxe o outono, que tem muito da sua aquarela, triste e risonha, com folhas cadentes em tom pastel